Na solidão da noite
Era uma vez, uma doce menina que não podia enxergar. Inocente, a cada dia desejava e desejava, o mundo poder observar. Seus pais sempre a acalentavam com lindíssimas histórias, transportando sua imaginação para um mundo colorido e alegre. A cada nova história, a menina pensava na possibilidade de ser capaz de enxergar tal mundo de cores vívidas e alegres, até que por fim veio-lhe a solução: o mundo dos sonhos. A menina, jovem e inocente, finalmente, desejou algo diferente, e naquela fatídica noite, finalmente, seu desejo veio a se realizar. Contudo, os sonhos podem ser traiçoeiros, e eis que neste doce desejo, a morte se pôs à espreitar:
Naquele mundo de sonho, cores não haviam e belos animais ali não viviam. Era um vasto mundo só. Nele, vivia somente ela, uma menina solitária. Com sua tez pálida, sustentava um olhar melancólico, que parecia penetrar, ansiar por cada detalhe, segredo de tudo em que pousasse seus olhos caliginosos que, coroados por pestanas arqueadas pareciam ainda questionar esta situação, este mundo de solidão e horror.
Seus longos cabelos avermelhados ao vento esvoaçavam, como se possuíssem vida própria, com uma delicadeza que lembrava uma dança ao som calmo de uma canção clássica. Irrequieta, a menina deslizava suavemente, e a cada passo, sentia como se fosse descobrir algo que pudesse mudar sua triste, mas real situação. O vento que lhe batia no corpo, vinha frio, e eriçava-lhe os pelos, lembrando-lhe constantemente: o inverno, pálido, mortal e triste, se aproximava.
Ao longe via-se o céu nublado, coberto por nuvens espessas, que por suposto divertiam-se num constante tapa sol. A luz vinha tênue e soturna, contribuindo em muito para tornar o ambiente em um local quieto e tenebroso. Não se via sequer um pássaro no horizonte, e nas árvores, nenhum inseto vinha pousar. Neste vasto mundo, ouvia-se somente o som melancólico do vento a acariciar as folhas das árvores de troncos escuros.
Tudo era lúgubre e frio, exceto a menina que com sua alvura de anjo caído, marcava com seus delicados pezinhos desnudos todo o caminho por onde passava. A cada passo, seu vestido, de um branco esvoaçante, dançava à mercê do vento, lembrando os suaves movimentos de uma madama apaixonada.
Neste triste mundo, marcado pelas cores frias de inverno, finalmente, a neve começou a cair. No horizonte viam-se inúmeros flocos brancos que á luz tênue do sol, reluziam. O mundo solitário tornou-se branco, uma eterna monotonia branca, quebrada somente por alguns pontos de cores escuras, tenebrosas e pálidas.
A precipitação de neve continuava, sempre a deslizar pelo ar até vir a assentar-se sobre o chão. A menina, enfim, se rendeu; pendendo seu corpo, deitou-se na neve, retornando enfim à seu utópico mundo cândido